Essa
semana decidi escrever sobre esse segundo romance do escrito norte americano,
Matthew Quick. Pra início de conversa, gostaria de compartilhar que o Sr. Quick
é muito simpático e atencioso com seus fãs. Eu tive o prazer de participar de
uma mesa de diálogo com ele na Bienal do Livro, que aconteceu aqui no Rio ano
passado, e durante todo o discurso Matthew se focou no famoso O Labo Bom da Vida, mas em um breve
resumo deixou claro que ler Perdão,
Leonard Peacock seria mudança na dinâmica de ver as coisas.
Então,
temos um título intrigante, no meu ver. Quem leu a obra deve estar se
perguntando, da mesma forma que eu o porquê desse perdão. Digo, em nenhum
momento há alguém que peça o perdão do Leonard, apesar de que muitas pessoas o
deveriam fazer, mas não fazem. Daí eu sempre fico pensando e pensando a
respeito dos títulos quando eles não se tornam claros durante a leitura e com
esse livro não foi diferente. Aí me veio à mente que possivelmente, pelo rumo
da história, quem leu sabe, que este perdão poderia vir do próprio Leonard do
futuro. Ok, isso ficou estranho, né? Vamos tentar entender as coisas de cada
vez.
Temos
um jovem que certa manhã acorda com a ideia de que em seu aniversário ele daria
um tiro na cabeça de seu inimigo, o famoso Asher, e cometeria suicídio logo em
seguida, mas antes ele precisa se despedir de quatro pessoas e entregar-lhes
presentes.
Tanto
em Perdão, Leonard Peacock quanto em O Labo Bom da Vida, Quick deixa seus
leitores intrigados no início ao fim com um suposto acontecimento que desencadeou
os fatos. Leonard é um menino que, por algum motivo, tem raiva de seu ex-melhor
amigo da escola e quer se vingar. Inicialmente, eu pensei que era algo
adolescente, mas acabei sendo surpreendida com a crítica social e psicológica
encontrada no decorrer do romance.
Há
três pontos que me chamaram bastante a atenção, e um deles se refere à
alienação da juventude contemporânea. É descrito que Leonard ama as aulas sobre
o Holocausto, ministradas pelo professor Herr Silverman, porém seus colegas de
classe costumam se opor às ideias dadas pelo professor, o que segundo o próprio
Leonard o deixa realmente irritado com a mesmice em que se encontra seus
colegas. Quando indagados a respeito das atitudes alemãs durante a Segunda
Guerra Mundial, Leonard narra para o leitor o quanto eles, em sala, são
hipócritas ora ou outra dizendo que jamais, nem sob pressão teriam entrado para
o exército nazista, jamais matariam pessoas inocentes. E nesses momento o
professor aprofunda essa crítica à alienação jovem quando ressalta que mesmo
vivendo em pleno início do século XXI, em um país livre os jovens optam assim
mesmo por usa tênis da Nike ou da Adidas, camisas da Hollister etc. para se
encaixar em um determinado grupo, o que o não uso dessas peças não permitiria.
Por que então declaram fielmente que não acompanhariam Hitler? Essa questão é
passada mais de uma vez para o leitor por nosso narrador-personagem Leonard
Peacock.
O
segundo ponto que eu marquei em minha leitura como sendo interessante é a raiva
que Leonard sente do ex amigo Asher e, como eu já disse anteriormente, pensei
ser algo comum, de adolescente, apesar de que decidir matar o melhor amigo não
devia ser consequência de um ato inocente. Pois, então, quando Leonard está em
frente à janela de Asher, com a arma apontada para ele através do vidro, nos é
esclarecido o motivo da angustia de Leonard, o que para mim não deixa de ser
uma enorme crítica social. A história começa quando Asher vai passar um final
de semana com um tio, pescando, mas quando volta dessas viagem Asher está muito
diferente, altamente estupido e grosseiro. Leonard, uma criança, não entende o
comportamento do melhor amigo que agora pede insistentemente para brincar de
luta, o que acaba gerando um assedio em relação ao Leonard. Tomamos conhecimento
então de que Asher passa por algum trauma com o tio, durante a viagem,
possivelmente uma violência contra seu corpo e começa a fazer o mesmo com
Leonard, que prontamente começa a ser “acusado” de ser gay.
A
terceira, e para mim, a mais importante das críticas sociais encontradas, é o
desprezo da mãe em relação ao menino. Há alguns meses comecei a assistir
Criminal Minds, uma série que tem como objetivo demonstrar para o pública como
funciona a cabeça de serial killers.
Conforme passam os episódios, eles vão traçando os perfis dos assassinos em
série, sempre tentando buscar a raiz do problema para aniquilá-la logo cedo, e
baseados em inúmeros casos um dos dados sempre colocados em evidência na série
informa que a maioria dos serial killers
se tornam esse tipo de monstro por algum distúrbio proveniente da formação do
seu caráter. Mesmo mostrando, inclusive, que esses assassinos possuem no
cérebro uma formação diferente das demais pessoas, o que dá o chute inicial
para começarem a matança é a constituição mal feita da família, algo na
construção da vida dessa pessoa ficou devidamente errada quando ele era
criança, desde a perda da mãe ou do pai, quanto abuso, ou ainda pior, quando
ele sofre o abuso e os pais preferem se omitir. E é exatamente isso que acontece
aqui com o jovem Leonard Peacock. Ok, ele não é um assassino em série, é um
suicida, mas creio que a linha entre o estilo de matança seja bem tênue, afinal
tanto um quanto o outro só vê a saída dos problema na morte. O que quero dizer
aqui é que Leonard decide se matar no mesmo dia em que chegou, na data do seu
aniversário e durante todo o romance é descrito o quanto a mãe não se importa
com ele. Seu pai desaparecido em algum lugar da Venezuela só lhe deixou a
antiga arma do avô e uma medalha, a mãe, por sua vez, simplesmente foi embora
para New York botar pra frente a carreira de estilista e deixou um menino, com
dezessete anos sozinho na Filadélfia, e a todo momento é lembrada por Leonard
que ela sequer se lembrou de ligar para lhe dar os parabéns. Estou longe de
desvendar os mistérios da mente humana e os impulsos gerados por ela, mas achei
a correlação interessante nesse âmbito.
Por
últimos, Herr Silverman, o professor, sabe que Leonard precisa de uma ajuda em
especial, que ele é diferente dos demais alunos, então o aconselha a escrever
cartas como se alguém no futuro estivesse mandando para ele. A primeira vem de
um comandante de uma espécie de exército do qual ele é o Tenente. A segunda de
sua futura esposa, conhecida como A. E as duas últimas de sua filha, S: uma
dela criança, e uma dela adolescente. Quando eu disse, lá em cima, que me
peguei observando o título do livro e associando a uma das cartas do futuro,
foi que quem mais poderia dizer Perdão,
Leonard Peacock? Sua mãe não lhe pediu desculpas em momento algum, tampouco
Asher. Mas poderia ser ele mesmo, em uma dessas cartas do futuro, o rascunho de
um diário em que o Leonard adulto, com família, tenente pedisse perdão ao
Leonard adolescente por um quase ter deixado ele se matar. Claro, que essa é somente
uma observação, existem muitas outras que infelizmente o Sr. Quick não
disponibilizou durante o diálogo.
Mas,
uma coisa realmente me deixou intrigada. A última carta, a da filha S
adolescente contempla o último capítulo do livro, e fala como ele foi um bom
pai, como ela o ama e o agradece por tudo, eu realmente me vi surpreendida com
a ideia de ser uma carta verdadeira. Não uma das que ele fez instruído por
Herr, mas uma carta de verdade, em seu próprio futuro. O que acham?